Friday, July 4, 2008

A Máquina Temporal De Thomás




Já se passaram dois anos. O sagrado whisky na mão esquerda o fazia lembrar dos tempos amargos e doces do passado. Até o maldito cigarro sem menta,sem canela, somente com nicotina na mão direita lembrava ela.
Deu várias risadas. Não acreditava naquelas imagens e falas da TV.

"Então! Finalmente ela conseguiu!"

Era a vigesima vez que via aquela reportagem. Já sabia de cor e salteado cada gesto e palavra mencionada no video de 15 minutos. Talvez fosse uma forma de se torturar,se punir. Mas ele apenas sorria, se contorcia, colocava as mãos na cabeça, aproximava os olhos da tela e depois num ato de repulsa se afastava bruscamente.

"Desgraçada"

Foi em um mesmo verão desses que viveu a época mais inocente e feliz da sua vida objetiva. Havia conhecido uma grande amiga. Pueril, em plenos 19 anos e ela 23. Ele era o melhor amigo, o melhor conselheiro. A tinha como uma irmã mais velha e mais louca.

"Sim,ela era louca."

Aos poucos penetrava nas muralhas da menina velha e mal criada. Contava ao cavalheiro histórias absurdas, de cigarros além da nicotina á noites mal acompanhadas que a mantinham acordada. Tinha uma vida inteira sem precisar dele. Se divertia, saía, dançava, amava.. sem precisar dele. Porém, não era isso que ela dizia nas noites vazias.
Ela tinha todos os erros possíveis de uma obra de Picasso. Tinha traços grotescos, absurdamente expressíveis. Cada cor extravagante pintada na tela do rosto dela e mesmo assim tinha uma harmonia invejável, dava uma sede "apoderável".

"Era perfeita."

Um repleto arco-íres que em qualquer outra ficaria irônico, nela caía como um vestido colorido numa flor ao amanhecer. Cheia de um perfume hipnotizador... Ela dançava em frente aos olhos dele, e ele entendia como um pedido humilde de amor.
E quando ela balançava as pétalas loiras feito um sol ascendente na direção do vento desfalecia o coração daquele menino-velho-sorridente.
As curvas daqueles rabiscos, um esboço de amor que não sabia que pudesse ser dele.

"Ahhh! Ela foi um verdadeiro amor."

Era como se a visse naquele momento, apesar de nunca ve-la realmente.

"Ela tinha uma vida inteira sem precisar de mim! Mas não era isso que ela me dizia..."

E se foi, como se nunca tivesse vindo.
Ele ainda tentou mandar uma carta, ligar para aquele vilarejo. Ela já não era mais quem ele tinha conhecido.
Sabia que se a apoiasse a crescer ele diminuíria ao ponto de ser uma pequena mancha no vidro de proteção daquela obra renegada de Picasso.
Mesmo assim, deu todo o apoio pra muralha ir além da fronteira que ele dominava.
De certa forma, deixou que partisse, e assim partisse em mil o seu próprio coração

"Eu queria poder dizer tudo isso a ela."

Que foi diferente. Ela era diferente de todos os vinhos que provou. Porque nunca a provou. Um sonho petrificado em uma tela, algo que jamais poderia ter em mãos. E num ato majestoso desprezava o paladar daquele cavalheiro quando nem se quer queria saber como ele estava, onde ele está agora, se sente saudades...

"Acho que vou vomitar fumaça com whisky."

Lá estava ela gloriosa sob um trono rodiado de súditos, vassalos, e milhares de "cavaleiros". Eles a rapitavam em seus cavalos acizentados, faziam parte da fantasia que ela mesma criava pra se afungentar de si mesma.

"Eu fui a realidade dela"

Só ele tinha esse dom de transportá-la para a pessoa magnifica que ela era. Ele talvez a amedrontava... era a unica realidade de verdades, e surreal de estar presente. Era um presente despresente. Na cabeça dela e na dele, real. Mas não haviam toques, perfumes, contatos...

"Deve ter sido por isso que não deu certo."

O sol já está invadindo com as flechas amarelas os olhos castanhos cor-de-mel daquele cavalheiro.

"Lá está ela, longe de mim. Conseguiu o emprego que queria, conseguiu a gloria que queria. Agora ela tem mais uma vida inteira sem precisar de mim. Nunca precisou. Sabia que me usava como distração, como uma peça envelhecida e empoeirada na anti-sala do seu magnifico quadro de Picasso. Ela nunca vai saber que eu,um singelo cavalheiro que se debruçava sobre os campos só para ve-la surgindo no horizonte com os seus raios amarelados, a amava ao ponto de criar asas e ir em direção a ela mesmo sabendo que tombaria feito Ícaro, iria até ela mostrar que ainda existe um velho-menino amando cada traço de um quadro que mesmo não sendo de Picasso, seria a maior obra de arte exposta na mente,alma e coração de um amante a espera da volta de quem um dia, sem que nenhum dos dois soubessem, fosse sua amada."

Essa é a Máquina Temporal de Thomás: um coração feito de lembranças.





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1 comment:

Anonymous said...

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